quinta-feira, agosto 04, 2005

Entrevista publicada no nº 2 da revista "Photo Novela" de Julho

Phn.: A sua formação académica é, sem dúvida, muito peculiar. Será que existem duas Manuelas Magno? Uma voltada para o campo das ciências, nomeadamente a Física Nuclear, outra para as Artes (Música)?

MM: Não existem duas Manuelas Magno. O que existe é uma Manuela Magno interessada em muitas e variadas áreas do conhecimento e da actividade humana. É comum ouvir-se falar das Artes e das Ciências como dois campos opostos e é até comum associar-se o conceito de “inteligência” à actividade científica e o de “sensibilidade” à actividade artística, mas um não exclui o outro, antes pelo contrário.

Phn.: Uma vez que estudou no estrangeiro, especificamente na Holanda (Amesterdão) e EUA (Nova Iorque), gostaria que comentasse o tipo de ensino que é ministrado nesses países por comparação com o que se pratica no nosso país. Quais as vertentes mais valorizadas? Quais os recursos que oferecem ao estudante?

MM: Conheço por experiência directa, como aluna e como docente, várias escolas em Portugal e no estrangeiro. Em todas elas há bons e menos bons professores, há bons e menos bons alunos. A grande diferença verifica-se ao nível da organização das escolas e dos ensinos, da qualidade dos recursos e na gestão desses recursos.
Dou alguns exemplos referentes a uma universidade nos EUA. No início de cada ano lectivo o aluno sabe claramente o que espera da instituição e o que a instituição e os seus professores esperam dele. Os horários nunca são alterados ao longo do ano. Em oito anos de aulas nos EUA, nunca um professor chegou atrasado, e nunca deixei de ter uma aula. No caso de um professor ter de faltar, houve sempre um professor substituto. Por outro lado, os recursos, tais como bibliotecas, salas de informática, salas de estudo, estão disponíveis (à excepção de algumas bibliotecas que fechavam da meia-noite às 8h da manhã) 24h por dia. Estas condições de disponibilidade e estabilidade propiciam um ambiente bem estruturado e estimulante que contribui para fortalecer o sentido de responsabilidade do aluno, fundamental para o seu desenvolvimento e bom aproveitamento.


Phn.: Sabemos que é actualmente Presidente do Conselho Pedagógico da Universidade de Évora. Qual o âmbito das suas funções?

MM: De acordo com os estatutos da Universidade de Évora, compete ao Conselho Pedagógico (CP) contribuir para a definição das linhas gerais de orientação da Universidade no plano pedagógico. No plano prático, o CP zela pelo cumprimento do “Regulamento Escolar Interno” e propõe medidas com vista a melhorar a qualidade do ensino e a promover o sucesso educativo. Sou por inerência do cargo, membro do Senado Universitário que é um dos órgãos de governo da universidade.


Phn.: Considera-se uma pedagoga?

MM: Se “pedagoga” for alguém que põe o seu saber, a sua sensibilidade e a sua energia ao serviço da “faina da humanização”, como dizia o meu saudoso professor Rui Grácio referindo-se ao ensino, e que, para cumprir essa faina, estimula nos outros o gosto pelo conhecimento, pela descoberta e o espírito crítico e que, além disso, não tem uma visão fechada sobre o que é o conhecimento, sim, considero-me uma pedagoga.


Phn.: Visitar Évora é como percorrer as páginas de um livro de história, havendo, contudo, uma grande diferença: aqui a história permanece viva ao mesmo tempo que acompanha a evolução dos tempos. Gostaria que comentasse esta afirmação.

MM: Évora é uma belíssima cidade cujo centro histórico foi classificado pela UNESCO como cidade património mundial.
A afirmação que me propõe recorda-me Miguel Torga que escreveu:
“Rendo-me. Diante de uma realidade assim, rendo-me, e digo mais: que vale a pena, afinal, haver história, haver arquitectura, e haver respeito por quantos souberam ser antes de nós bichos e poetas do seu casulo. […] nenhuma cidade nossa, salvo Évora, foi capaz de me dizer com pureza e beleza que eu sou latino, que eu sou árabe, que eu sou cristão, que eu sou peninsular, que eu sou português”[…]


Phn.: Qual o estado da cultura em Évora relativamente à cultura da capital? Considera que os apoios que o Estado português canaliza para o desenvolvimento cultural a nível das regiões são suficientes?

MM: Não irei comparar o estado da cultura em Évora relativamente a Lisboa. Évora é uma cidade com cerca de cinquenta mil habitantes, a zona da grande Lisboa tem cerca de dois milhões… A oferta cultural em Évora é diversificada e geralmente de bom nível. Há teatro, cinema, dança, música, exposições, galerias de arte, livrarias e vários centros de ensino e criação artística, nomeadamente o Departamento de Artes da Universidade de Évora, onde sou professora.
Mais do que falar em apoio do Estado para o desenvolvimento cultural, prefiro falar da responsabilidade do Estado. No Artigo 43º da Constituição da República Portuguesa (a nossa Lei fundamental e que tanta gente desconhece), pode ler-se: “Todos têm direito à educação e à cultura”. Estamos longe de ter alcançado este objectivo.

Phn.: Sente-se realizada profissionalmente? O que falta fazer? Quais os seus projectos para o futuro?

MM: Sem dúvida que gosto do que faço e, porque a “faina da humanização” é um processo que nunca está concluído, continuarei com prazer e entusiasmo a trabalhar empenhadamente nesse sentido. Para além das questões directamente relacionadas com a formação de Músicos e de Professores de Música, o meu principal interesse, neste momento, é aprofundar o conceito de cidadania e as formas de exercer os deveres e direitos que lhe estão associados.
Há cerca de um ano, decidi candidatar-me às próximas eleições Presidenciais. Não tenho, nem nunca tive, envolvimento político-partidário. Os candidatos presidenciais só podem ser propostos pelos cidadãos (num mínimo de 7500), e não pelos partidos políticos. Actualmente, a minha prioridade é concretizar a recolha desses apoios. No meu sítio na Internet, que pode ser consultado em www.manuelamagno.com.pt, é possível aceder a informação sobre o processo eleitoral do Presidente da República e sobre o meu projecto de candidatura.